Personalização ou invasão?
Ser tratado como apenas mais um ou receber uma enxurrada de anúncios sem sentido não é algo desejado por nenhum de nós.
Ao dirigir, um anúncio ao lado do semáforo, ao entrar no elevador, uma TV com propagandas, ao clicar para ler uma matéria, inúmeros anúncios por cima, que impedem a leitura e até naquela pausa para o café, eis um anúncio no balcão!
Em um passado distante, esses fatos poderiam facilmente passar despercebidos, mas, hoje em dia, definitivamente não o são.
As pessoas têm relações com as marcas, criam vínculo, apego e se tornam fiéis quando sentem que a conexão é real, recíproca e que a marca a compreende e trabalha para suprir suas dores. Mas, por outro lado, o ranço, a raiva e o saco cheio também existem. Afinal, quem nunca pediu para se descadastrar de uma newsletter ou deixou de seguir nas redes sociais por simplesmente não querer ver mais nada daquela empresa?
O grande desafio para os profissionais que, como eu, atuam com marketing e publicidade é não deixar as marcas caírem nisso. Mas como torná-la querida por pessoas tão distintas que compõem seu público? Eis a questão que toma horas diárias de brainstorming e discussões na vida dos publicitários.
O ponto comum que vemos em tudo isso é entender o cliente, seus anseios, seus desejos e suas dores. Nesse cenário, surge a personalização, estratégia utilizada para oferecer produtos e serviços que façam sentido para o consumidor, fugindo de ofertas sem nexo, que, além de não despertarem a atenção, estarão desperdiçando os recursos da empresa ao promover uma propaganda que será ignorada.
Essa técnica é possível graças aos recursos tecnológicos que se utilizam de rastreamentos virtuais, por exemplo. Assim, uma pessoa que buscou por ração para cães obesos poderá passar a receber ofertas de plano de saúde animal, petiscos para cães especiais, ofertas de clínicas que atendem em domicílio e outros produtos e serviços que facilitem a rotina de quem tem um cão que necessita de cuidados.
Embora essa estratégia não seja algo totalmente novo, a personalização vem ganhando força com os recursos digitais e tem sido explorada pela maioria das empresas que atua com foco na experiência do cliente.
Mas não pense que a utilização dessa técnica se restringe ao mundo digital. Hoje, até os PDVs estão muito mais preparados para receber seus clientes de forma personalizada, interativa e com capacidade de unir o mundo físico ao digital, por meio de experiências visuais, sensoriais, com atendimentos e serviços diferenciados.
Uma boa forma de utilizar a personalização é inseri-la de forma a ajudar o consumidor no dia a dia, criando proximidade e utilizando essa técnica de modo que faça sentido.
Um excelente exemplo de personalização que tem o poder de soar natural aos olhos do consumidor é a Netflix e outros serviços de streaming, que trazem sugestões de filmes e séries com temas parecidos com os já assistidos. Viu só como a personalização pode ser usada de forma inteligente e amigável?
Algumas marcas levaram a personalização para além do digital, gerando experiências físicas e marcando época. Quem aí não teve ou ainda tem uma latinha de Coca-Cola com seu nome no rótulo? E olha que nem precisava ser fã da marca para querer caçar uma embalagem com seu nome estampado nas gôndolas de supermercado!
Mas a busca incessante por personalização fez com que algumas empresas ultrapassassem os limites da estratégia e do bom senso.
A personalização se utiliza do cruzamento de dados para captar informações e mapear o perfil, a jornada e os hábitos de cada consumidor.
Com isso, a corrida por esses dados vem ultrapassando limites, chegando a invadir a privacidade e até a intimidade de cada indivíduo.
É preciso haver limites e saber a hora de parar. As pessoas querem ser compreendidas, ter seus problemas resolvidos de forma ágil e obter soluções viáveis. Isso é personalização, oferecer soluções que facilitem a vida do cliente no momento certo e sem exageros.
E, quando as empresas perdem a mão no bom senso, a personalização se transforma em invasão. Pessoas têm seus dados rastreados sem limite e passam a se sentir perseguidas com tantas propagandas e apelos de compra abusivos.
A personalização deve ter como objetivo despertar a confiança e uma boa experiência com a marca, criando um vínculo forte de compromisso e de fidelização.
O que passa disso vira perseguição, uma busca incessante por dados, e, não à toa, a LGPD está aí com tudo para impedir a prática abusiva de coleta e uso de dados pessoais.
E então, a solução
Se como profissional de marketing você está pensando apenas em base de dados, números e estatísticas, apenas pare. Pense e repense o outro lado da moeda, que é você mesmo como consumidor. O bom senso continua sempre bem-vindo em qualquer campanha.
Crie experiências positivas e de qualidade para que seus consumidores não efetuem apenas a compra do momento, mas sim criem uma relação de confiança com a sua marca.
Busque o equilíbrio do cruzamento dos dados criando bases segmentadas com históricos que mapeiem a jornada do cliente, e, para isso, não é preciso saber nem utilizar dados intimamente ligados às pessoas.
Uma dica de mestre: utilize a tecnologia de forma inteligente, fazendo a clusterização das bases com filtros nas informações. Não é preciso rastrear os detalhes da vida de uma pessoa para identificar seus hábitos de compra, seu estilo e seus interesses. Entenda que nem tudo é uma louca corrida para acumular dados. Antes disso, vem o ser humano que está por trás da tela.
Por fim, o equilíbrio é tudo, e se colocar no lugar do outro nunca saiu de moda.